Antes de defender com unhas e dentes a eletromobilidade, é sempre bom analisar prós e contras desta tendência e entender que há outros caminhos, muitas vezes, até mais em conta e mais ecológicos.

Ao término da última COP26 (Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas), em outubro passado, em Glasgow, na Escócia, os organizadores emitiram documento histórico que aponta, pela primeira vez, os combustíveis fósseis como grandes vilões das mudanças climáticas. Como parte do acordo os países signatários se comprometem a reduzir (não eliminar) a utilização de carvão, petróleo e gás.

O lado mais prático desse documento é que vai aumentar substancialmente a pressão para que empresas busquem, de maneira mais enfática, combustíveis alternativos para geração de energia e, especialmente, para mobilidade.

Se governantes admitem agora quem é o grande culpado pelas emissões de CO2, as empresas, meia década antes, já se movimentaram neste sentido, de forma ainda mais abrangente, ao elaborar e promover a Pauta ESG valorizando negócios que promovam ações voltadas ao meio ambiente, ao bem social e às boas práticas de governança.

Portanto, sob pressão de grandes corporações e, agora também, de governos, os combustíveis oriundos do bom e velho petróleo estão cada vez mais com os dias contados. Mas ao analisar as alternativas e considerar prós e contras, possivelmente a eletromobilidade também não será a panaceia a favor do meio ambiente.

Todo processo para se produzir veículos elétricos não é exatamente muito amigável à natureza e, ainda como agravante, há os metais pesados que são utilizados nas baterias, que, além de tudo, são caras, pesadas e altamente tóxicas. Além disso a mineração do lítio é altamente prejudicial à natureza.

Há, por ora, um certo frisson da sociedade por veículos elétricos. Os lançamentos de carros, ônibus, vans e caminhões elétricos se multiplicam. Algumas montadoras anunciaram que até o final desta década vão produzir somente veículos elétricos. Aqui no Brasil Mercedes-Benz anunciou ônibus urbano elétrico, a Volkswagen Caminhões e Ônibus começou a produzir e vender o e-Delivery, seu caminhão leve 100% elétrico e (veja nesta edição) a JAC apresentou sua van elétrica.

Mas a alta engenharia automotiva sabe bem que os elétricos, embora sejam perfeitos quando prontos (pois não emitem CO2 algum e são extremamente silenciosos), deixam um rastro de sujeira pelo caminho até chegar às revendas e, no fim de sua vida útil, suas baterias podem causar severos e irreversíveis danos ambientais.

Cientes dos problemas, sem muito alarde, engenheiros automotivos seguem em busca de combustíveis alternativos (não fósseis) que podem funcionar muito bem e ser, considerando todo processo (da produção ao final de sua vida útil do veículo), positivamente saudável à natureza. O próprio etanol, tecnologia que o Brasil domina há décadas, é um bom exemplo de combustível que entrega crédito de carbono considerando todo seu processo produtivo (do plantio de cana ao beneficiamento nas usinas).

Há pouco mais de um mês, em Sorriso, MT, a empresa de alimentos Nutribras, que processa cerca de três mil suínos por dia, apresentou o primeiro caminhão brasileiro movido a biometano suíno. O veículo, um Mercedes-Benz, ainda em fase experimental, conta com um motor híbrido, que também é movido por óleo diesel.

A Scania é uma das primeiras fabricantes a apostar suas fichas no aumento da adoção do gás natural e do biometano na matriz de transportes nacional. “Só dos resíduos da agricultura e da pecuária, temos uma possibilidade enorme de gerar biometano que é mais barato que o gás natural. Existe esse potencial porque a agricultura brasileira é pujante. Haverá uma aceleração do processo de adoção do biometano”, diz Silvio Munhoz, diretor comercial no Brasil, Silvio Munhoz.

Em junho do ano passado, a Scania fez a maior venda de caminhões movidos a GNV ou biometano do Brasil ao entregar à PepsiCo 18 veículos (dez unidades do G 340 4×2 e oito do R 410 6×2). De acordo com a montadora, o custo por quilômetro rodado do Scania GNV é cerca de 15% menor que o similar impulsionado a diesel nas mesmas condições de uso (embora o caminhão seja quase o dobro do preço de seus similares a diesel).

Contudo, sob o ponto de vista ambiental, abastecido com biometano, os caminhões emitem até 90% menos de CO2 e com GNV a redução chega a 15%. A autonomia média dos caminhões Scania GNV são de 500 quilômetros. Atenta à Pauta ESG, a PepsiCo tem como meta reduzir 20% de CO2 em sua cadeia até 2030.

Outra alternativa que vem ganhando corpo, especialmente entre os engenheiros alemães, são os combustíveis sintéticos. Eles são produzidos sem petróleo, utilizando como matéria-prima água e dióxido de carbono que tem em abundância na atmosfera. Embora ainda de custo elevado, o processo pode ser feito por meio de energias renováveis, livre de enxofre e benzeno. O hidrogénio, produzido através da eletrolise da água, reage com dióxido de carbono captado da atmosfera através de novas tecnologias.

Outro benefício importante é que este combustível pode ser utilizado normalmente nos automóveis atuais e, igualmente, nos postos de abastecimento já existentes. Ou seja, não é preciso uma substituição da frota circulante como pode acontecer caso todos passem a utilizar veículos elétricos (sem contar que, se isso de fato ocorresse, é bem certo que o sistema não dará conta da alta demanda por energia elétrica).

Há pouco tempo, o vice-presidente da Porsche, Frank Walliser, afirmou a jornalistas que os motores a combustão com eFuel emitem tanto dióxido de carbono (CO2) como um veículo elétrico, considerando todo o processo (da produção do combustível ao veículo rodando), incluindo a produção das baterias. O executivo disse que “os primeiros ensaios com a eFuel deverão começar em 2022”. Avançou ainda com uma potencial redução de emissões de CO2 para a gasolina sintética de 85%, um ganho similar face ao que emitiria um elétrico num ciclo completo.

Petrobras

A petrolífera brasileira lançou dois programas que visam preparar suas atividades de refino e gás natural para um mercado aberto, competitivo e em transição para economia de baixo carbono. O Biorefino 2030 prevê projetos para a produção de uma nova geração de combustíveis, mais modernos e sustentáveis que os atuais como, por exemplo, o diesel renovável e o bioquerosene de aviação.

Ainda na área de refino, a companhia pretende reduzir em 30% a captação de água em suas refinarias e em 16% a intensidade do carbono do segmento até 2025.

“Queremos trazer produtos renováveis para o nosso parque de refino, nos negócios em que temos expertise e que geram valor para a companhia. Por isso, focaremos num parque de refino de excelência, produzindo com alta eficiência energética e preparado para competir e gerar produtos mais modernos, com inovações tecnológicas que trazem ganhos em termos de redução de emissões não só nas nossas operações, mas em toda a cadeia de valor”, destaca a diretora de Refino e Gás Natural da Petrobras, Anelise Lara.

O diesel renovável é um biocombustível avançado, produzido a partir de óleos vegetais e com a mesma estrutura do óleo diesel convencional. Esse novo combustível reduz em 70 % a emissão de gases de efeito estufa se comparado ao óleo diesel mineral e15 % em relação ao biodiesel éster. É isento de contaminantes e não causa danos aos motores, aumentando, na prática, a vida útil dos veículos e reduzindo o custo dos transportes. Sua comercialização no Brasil como biocombustível depende ainda de regulamentação da ANP.

O BioQAv ou bioquerosene de aviação será utilizado no mundo para a redução das emissões de gases de efeito estufa. Essa é uma resolução da Organização da Aviação Civil Internacional (OACI) e o Brasil deverá utilizá-lo obrigatoriamente a partir de 2027. O processo de produção do BioQAv por hidrogenação utiliza as mesmas matérias primas necessárias para a produção do diesel renovável. As unidades industriais que produzem o BioQAv têm como coproduto o diesel renovável (HVO). Desta forma, se por um lado a produção de BioQAv pode ser estimulada pela do diesel renovável, por outro, pode aumentar a competitividade de ambos os produtos.

A Petrobras também prevê investimentos para o aumento da produção de diesel S-10, de baixo teor de enxofre, em detrimento ao diesel S-500. Para isso, serão realizadas modernizações em unidades da Reduc, em Duque de Caxias-RJ, e da Revap, em São José dos Campos-SP. Também será construída uma nova unidade de hidrotratamento de diesel na Replan. Outra iniciativa em estudo é a integração da Reduc com o Gaslub Itaboraí, que permitirá a produção de lubrificantes de alta qualidade, de nível tecnológico mais avançado.

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Combustíveis alternativos mais conhecidos

HVO

O óleo vegetal hidrogenado (HVO, Hydrogenated Vegetable Oil) é uma solução moderna para produzir combustíveis de diesel de base biológica de alta qualidade sem comprometer a logística do combustível, os motores, os dispositivos de pós-tratamento dos gases de escape ou as emissões de gases de escape.

O HVO pode ser produzido a partir de diversas fontes, como óleo residual, óleo de canola, óleo de palma e gordura animal. O uso dessas três fontes de energia exerce um enorme impacto sobre a redução de gases do efeito estufa. Em comparação com o diesel padrão, é possível alcançar uma redução de CO2 ideal de até 90% nas emissões de CO2.

Biodiesel

O biodiesel (ou FAME, éster metílico de ácido graxo) pode ser produzido de várias fontes, como óleo de canola, vegetal e óleo de cozinha usado. Além disso, o biodiesel tem a vantagem de ser um líquido disponível em grande quantidade.

O suprimento de biodiesel sustentável está sendo usado principalmente para ser misturado ao diesel ou em forma 100% pura. Em comparação com o diesel padrão, estima-se uma redução de CO2 ideal de até 85% nas emissões de CO2.

Biogás

O biogás pode ser produzido a partir de inúmeras fontes, mas o método mais sustentável e com melhor relação custo-benefício é usar resíduos ou esgoto locais. O biogás tem a mesma composição química do gás natural, mas é uma fonte de energia renovável, enquanto o gás natural é um combustível fóssil. Os dois combustíveis podem ser usados simultaneamente.

Gás natural

O gás natural é o gás metano encontrado em bolsões na crosta terrestre. Ele é extraído de depósitos de gás separados ou concomitantemente à extração de petróleo. O gás natural é um combustível fóssil; porém, como a molécula de metano contém apenas um átomo de carbono, a quantidade emitida de CO2 durante a combustão é menor, em comparação à de um motor a diesel convencional.

Bioetanol

O bioetanol é o biocombustível mais usado em transporte nos dias de hoje. Ele também é o combustível com mais chances de suprir volumes grandes e sustentáveis no futuro. Uma das principais vantagens é que ele é líquido e está disponível globalmente em grandes volumes.

Pode ser produzido de várias matérias-primas, como cana-de-açúcar, trigo e milho. Podem ser usados também resíduos ricos em amido ou açúcar, como celulose ou pão. Além disso, o bioetanol é relativamente fácil de produzir, até mesmo em pequena escala. Em comparação com o diesel padrão, estima-se que a redução de CO2 ideal alcance até 90% nas emissões de CO2.

Híbrido

O híbrido é movido por energia elétrica combinada com um biocombustível. Isso reduz enormemente o consumo de combustível que, por sua vez, resulta em menor emissão. Além disso, a redução do ruído permite que o veículo híbrido tenha benefícios especiais, como dirigir em áreas urbanas durante a noite ou de madrugada.

As entregas fora do horário de pico oferecem vários benefícios, como a redução no tempo de condução, no consumo de combustível e na emissão de CO2. Isso também prolonga o uso do veículo. Em comparação com o diesel padrão, é possível alcançar uma redução de CO2 ideal de até 90% nas emissões de CO2.

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