Células a combustível alimentadas por hidrogênio de etanol e gerando energia elétrica inteiramente limpa em todo seu processo se mostra cada vez mais como uma tendência para a mobilidade sustentável, especialmente quando se considera longas distâncias.

A eletromobilidade, sem dúvida, vai imperar no futuro próximo. Nesta década de 20 do Século 21 já temos diversos indicadores de que carros, caminhões, vans, furgões, ônibus, trens e, não muito distante, aviões, terão propulsão elétrica sem emissão alguma de poluentes. A grande questão ambiental, na verdade uma dúvida cruel, é quanto à produção das baterias cuja manufatura e, depois, descarte, não são exatamente o que se pode esperar de algo minimamente sustentável.

Além disso, quando tratamos de transporte de longa distância, está totalmente descartado veículos elétricos como estão já produzindo em todo o mundo. Por isso andam avançadas as pesquisas em torno das células a combustível valendo-se de hidrogênio. Toda engenharia desse processo, atualmente, ainda é complexa e cara mas os avanços tecnológicos demonstram que podem se tornar, no curto prazo, economicamente mais viáveis e cada vez mais sustentáveis.

Para resumir de maneira didática: célula a combustível é um transdutor eletroquímico, de operação contínua, que converte energia química em energia elétrica ao combinar um átomo de oxigênio a dois átomos de hidrogênio produzindo água, energia elétrica e energia térmica. Sobre o tema, o comentário de Eustáquio Sirolli, diretor de engenharia da Foton do Brasil, decano engenheiro automotivo que estuda e pesquisa células a combustível há anos, é emblemático: “um veículo movido a hidrogênio emite vapor de água pelo escapamento”.


A célula a combustível é um equipamento que realiza uma reação eletroquímica entre o oxigênio e o hidrogênio que não representa combustão. Normalmente esses sistemas possuem alta eficiência, são silenciosos e podem ser montados de forma modular, uma vez que não possuem partes móveis.

Outra grande vantagem de se utilizar o hidrogênio é que o Brasil tem alto potencial, especialmente com o etanol como fonte primária deste gás. Vamos logo de cara deixar bem claro que sim, tecnicamente é possível extrair o hidrogênio até mesmo da água, mas o custo para fazer essa operação torna inviável o processo. Por isso os estudos avançam na utilização de outras fontes mais energéticas para gerar moléculas de hidrogênio.

É preciso entender que, em seu estado natural, o hidrogênio é um gás incolor e inodoro. É uma molécula com grande capacidade de armazenar energia e, embora esteja presente em diversos locais, o hidrogênio raramente pode ser obtido diretamente na natureza. Por isso sempre será preciso algum tipo de processamento para extração dessa energia.

Atenção para forma como o hidrogênio é obtida

Na Terra, o hidrogênio não é encontrado em sua forma mais pura, e sim na forma combinada (hidrocarbonetos e derivados). Por esse motivo, o hidrogênio deve ser extraído de diversas fontes. As principais fontes de hidrogênio são gás natural, etanol, metanol, água, biomassa, metano, algas e bactérias, gasolina e diesel.

Ou seja, essas importantes fontes de hidrogênio são fósseis. O processo de separação de hidrogênio consiste basicamente no mesmo para a gasolina, nafta, metanol ou até outras fontes renováveis, como o etanol. Independente da fonte, esses processos sempre emitirão poluentes atmosféricos.

Deste modo, levando-se em consideração a fonte para extração dessa energia, o hidrogênio pode ser classificado como verde, azul ou cinza.

Hidrogênio Cinza é um termo que se refere ao hidrogênio obtido a partir da queima de combustíveis fósseis, principalmente gás natural. De modo geral, a conversão de gás natural em hidrogênio ocorre em um processo chamado de reforma a vapor, ou Steam Methane Reforming (SMR), em inglês. A reforma a vapor é responsável por liberar grandes quantidades de dióxido de carbono na atmosfera, gás que intensifica o aquecimento global e, consequentemente, as mudanças climáticas.

Hidrogênio azul é obtido a partir da queima de combustíveis fósseis, como gás natural e carvão mineral, seguida da captura e do armazenamento de carbono emitido no processo. Conhecido como “gás descarbonizado” ou “gás de baixo carbono”, o hidrogênio azul é considerado uma fonte de energia limpa, apesar de existirem controvérsias.

Hidrogênio verde é o processo que cientistas e engenheiros estão julgando o mais interessante e viável para o mundo e que é possível haver maior protagonismo do Brasil. Esse hidrogênio é obtido a partir de fontes renováveis, em um processo no qual não haja a emissão de carbono. Diferente dos combustíveis fósseis, o aproveitamento energético do hidrogênio raramente se dá por sua combustão, mas sim por meio de uma transformação eletroquímica, realizada em células conhecidas como células a combustível.

Nesses equipamentos, o oxigênio existente na atmosfera se combina com o hidrogênio, produzindo energia elétrica e água. Ou seja, o processo de geração de energia por meio de células a combustível em si não impacta o meio ambiente, razão pela qual pode-se classificá-lo como sendo um processo limpo.

Exemplos no mundo

A Nissan vem dando passos largos nesse processo de células a combustível de hidrogênio verde gerado por etanol. Um exemplo é o Nissan e-Bio Fuel Cell que, com um tanque de 30 litros, é capaz de rodar 600 km. Em parceria firmada com o Ipen, a montadora japonesa faz uso das moléculas de hidrogênio contidas no etanol para gerar energia limpa (da origem ao destino final).

Além da Nissan, grandes empresas como Bosch e Volkswagen estão trabalhando em conjunto com USP, Unicamp e usineiros de cana e milho para avançar nesse processo. “A tecnologia eles já conhecem, sabem como funciona, agora buscam viabilizar o processo tornando-o economicamente mais viável”, comenta Sirolli.

Caminhões

Em setembro de 2020, em plena pandemia Covid-19, a Daimler apresentou aos jornalistas seu primeiro caminhão conceito da marca Mercedes-Benz movido a célula de hidrogênio, o GenH2, dedicado ao transporte de longa distância.

next level Mercedes-Benz GenH2 Truck

Com autonomia de mais de 1 mil quilômetros, graças ao uso de hidrogênio líquido, o modelo marca o uso da tecnologia de célula a combustível, que entrará em testes com clientes no ano que vem. Segundo a empresa, sua produção está prevista para a segunda metade desta década, portanto, após 2025.

O Grupo Paccar, dono da marca DAF, também testou ano passado caminhões movidos a células a combustível à base de hidrogênio. Mas, ao contrário das pesquisas que vem sendo feitas no Brasil, tem uma posição um pouco menos animada com relação ao combustível verde.

Diz nota no site da empresa: “Por mais promissor que isso possa parecer, a tecnologia de transmissão para caminhões movidos a hidrogênio ainda está em estágio experimental e, portanto, muito cara. Além disso, o hidrogênio está disponível apenas em quantidades limitadas e deve ser comprimido sob pressão muito alta (700 bar) a temperaturas extremamente baixas (-253 graus Celsius). Também não há infraestrutura de distribuição instalada no momento”. De acordo com a DAF, “levará entre cinco e dez anos antes que o hidrogênio possa ser usado em grande escala”.

Por outro lado, em 2020 a Hyundai anunciou a venda de sete caminhões pesados, cujo nome é Xcient, movidos à célula a combustível de hidrogênio para uma transportadora na Suíça. E afirma que, até 2025, vai vender mais de 1,5 mil caminhões a hidrogênio na Europa. As apostas estão na mesa. Em pouco tempo será possível ver claramente quem fez a leitura mais assertiva sobre as novas tendências de um mercado que não pode mais desprezar os efeitos de suas decisões no meio-ambiente.

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