Gestão de resultados com filosofia surfista

Formado em administração de empresas, com ênfase em Finanças, pela Bond University, na Austrália, Tayguara Helou também tem pós-graduação em gestão de negócios, pelo Holmes College, também na Austrália; MBA em Gestão Empresarial, pela FGV e ainda está nos planos acadêmicos fazer doutorado em alguma área mais tecnológica.

Neste ano, Tayguara finaliza seu segundo mandato à frente da Setcesp, entidade que congrega mais de 20 mil transportadoras do Estado de São Paulo. Ele foi eleito em 2016, reeleito em 2019 e finaliza sua gestão em dezembro deste ano. Sob sua batuta, a entidade passou por forte processo de inovação tecnológica se tornando mais digital e inclusiva.

Tayguara que desde adolescente frequenta a Setcesp, como também passava férias na Braspress, empresa criada e comandada por seu pai, Urubatan Helou, foi o primeiro presidente jovem da história de 85 anos da entidade.

Apaixonado e praticante de surf, Tayguara aplica em seu dia a dia a filosofia deste esporte: paciência, tranquilidade, equilíbrio, respeito e aguçado senso de oportunidade. Além disso, como todo ser humano que sabe aprender com a natureza, especialmente com os ensinamentos do mar, o presidente da Setcesp é uma pessoa acessível, humilde e de sorriso fácil.

Por isso, essa entrevista exclusiva, fruto de uma conversa descontraída que tivemos em nosso estúdio, na gravação da edição de agosto de Transpodata, foi rica em conteúdo e, também, muito assertiva como visão de futuro do transporte rodoviário de carga no Brasil.

TranspoData: Com toda essa transformação digital que o mundo vem passando, com Indústria 4.0, logística inteligente, e-commerce mais eficiente, qual é o novo perfil do transportador de cargas?

Tayguara: Sem dúvida, é um perfil muito mais moderno. Mesmo porque, ele está inserido em um ambiente tecnológico mais avançado, aliás, vale destacar que a pandemia acelerou, ainda mais, a inovação nas empresas. As empresas estão investindo bastante em treinamentos e na utilização das tecnologias, primeiro para melhorar a eficiência do transporte como um todo, e segundo, para informar o cliente como e onde está a carga dele.


TranspoData: No seu ponto de vista, os transportadores estão acompanhando toda essa evolução? E para acompanhá-la é preciso mais investimentos?

Tayguara: Sim, estão. Os transportadores vêm acompanhando e sendo parte dessa evolução. O transportador é um empresário resiliente, que realmente busca se adequar ao ambiente, porque subsistimos do desenvolvimento econômico, ou seja, daquilo que demanda o mercado de produção e o de consumo. Então, posso dizer que o transportador está habituado a essas transformações. Porém, ainda sofremos com o problema do alto custo tecnológico, e isso sim dificulta novos investimentos. No Brasil, o custo da tecnologia é mais alto do que em outros lugares do mundo, seja no desenvolvimento, na parte hardware ou na mão de obra especializada.

TranspoData: Ficou mais caro e mais difícil ser um transportador nestes novos tempos quando comparamos com o perfil dos transportadores dos anos 90, por exemplo?

Tayguara: Não dá para dizer que ficou mais caro, e sim, mais profissionalizado. No passado, o transporte rodoviário de cargas era um setor muito mais simplista, hoje não, é business sério, que inclusive envolve capital aberto, e que requer sistemas de gestão e de governança, que busca inovações e investimentos no desenvolvimento de novos serviços. Não ficou mais difícil, ficou mais profissional.

TranspoData: Ainda é possível, como acontecia antigamente, de um caminhoneiro virar um transportador bem-sucedido? Se sim, como isso pode acontecer (sem utopias).

Tayguara: Claro que sim, aliás, o caminhoneiro autônomo já é um empresário, um microempresário. Veja bem, uma carreta com implemento custa em torno de 400 a 500 mil reais, ela carrega na carga fracionada, em média, entre 1,5 milhão a 2 milhões de reais de carga em uma viagem. Esse autônomo de fato, já é um empresário. Isso não é utopia, é uma realidade. E quando esse autônomo cria estrutura e tem a visão de onde ele quer operar, e passa a ter estratégias, ele cresce, tende a comprar um segundo caminhão e depois recrutar uma equipe para auxiliá-lo. E a gente vê muitos exemplos disso acontecendo.

TranspoData: Aliás, o que é “ser bem-sucedido” hoje em dia no segmento de transporte de carga? Ter uma frota grande ou ter grandes e rentáveis clientes? Qual o novo critério para se definir um transportador bem sucedido?

Tayguara: A definição de um transportador bem-sucedido cairia naquela máxima, gosto não se discute, porque tem diversas variações. No meu ponto de vista, o transportador bem-sucedido seria aquele que consegue buscar escala seguindo corretamente a legislação, dentro das regulamentações que o transporte rodoviário de cargas requer, e ainda, sendo rentável. Rentabilidade é a alma do negócio.

TranspoData: O que os transportadores realmente pensam sobre a eletro mobilidade no setor? Isso é mesmo possível ou vai servir mesmo mais para marketing onde algumas empresas posam de “amigas do meio ambiente”?

Tayguara: A eletrificação da frota no setor tem sido levada muito a sério. Nós, no SETCESP, já estamos estudando esse campo há pelo menos cinco anos. Fizemos, no passado, algumas viagens técnicas para avaliar essa questão, buscando informações a respeito e acompanhando de perto essa tendência. Não é só o caminhão, existe todo um ecossistema para a eletrificação da frota, que já provou-se ser mais eficiente do que os veículos a combustão. É óbvio, que o valor do veículo é mais alto, porém o custo total de operação por um determinado período se torna muito mais eficiente, e isso precisa estar claro. Se conseguimos montar esse ecossistema isso vai funcionar para o caminhão pequeno e médio, que opera na distribuição urbana. A gente não vê eletrificação de frota para veículos pesados e extrapesados. Os transportadores estão olhando para essa realidade, o veículo elétrico tem a capacidade de potencializar o resultado operacional das empresas e elas estão caminhando neste sentido.

TranspoData: A pauta ESG, que passa a ser cada vez mais cobrada por muitos embarcadores, será amplamente aplicada às transportadoras ou ainda há muita resistência?

Tayguara: Os critérios do ESG já estão sendo colocados em prática pelas transportadoras há algum tempo. No SETCESP, nós temos o prêmio de Sustentabilidade, que também abrange estes três pilares, consideramos a responsabilidade ambiental, social e econômica, que é a governança. Inclusive, adicionamos o quarto item que é o de responsabilidade da segurança viária e do trabalho. As empresas da nossa base já praticam isso, e a cada ano, mais e mais empresas participam trazendo seus projetos de boas práticas para o Prêmio de Sustentabilidade.


TranspoData: Na sua opinião, o que é mais importante para a realidade nacional sob o ponto de vista econômico, social e ambiental: caminhões elétricos que custam três vezes mais que os convencionais ou uma política verdadeiramente eficiente para renovação de frota?

Tayguara: Na realidade, os dois pontos são extremamente importantes, não dá para colocar um ponto contra o outro, quando na verdade eles se complementam. Ambos são importantes do ponto de vista social, ambiental e econômico. Não vamos separar esses dois fatores. O custo do veículo elétrico é alto sim, mas a gente já observa que esse custo tem reduzido e a tendência é que ele diminua um pouco mais para a conta fechar. Entretanto, não se pode olhar só custo, é necessário olhar o cost of ownership (custo total de propriedade) porque aí você avalia o bem durante sua vida útil e então é possível tirar o melhor resultado deste veículo.

Precisamos trabalhar um plano de renovação de frota eficiente para o país, com o aumento exponencial do custo dos caminhões no Brasil, é bem provável que a frota volte a envelhecer, então temos dois grandes debates, mas sem jogar um tema contra o outro.

TranspoData: Quais fatores os transportadores mais levam em conta na hora de renovar sua frota? Preço? Tecnologia embarcada? Conforto para o motorista? Pós Venda?

Tayguara: A compra de um veículo 0km leva em conta vários fatores. E geralmente, se segue o mesmo critério de compra para a renovação ou ampliação da frota. Na renovação você já tem conhecimento absoluto da operação para a qual este veículo será utilizado, qual o tipo da carga, peso, dimensão altura, então você tem mais informações técnicas para fazer uma compra mais assertiva. Muitos transportadores compram veículos com essa base, outros usam métricas diferentes, mas creio que esses pontos mencionados são os que pesam mais na hora da compra. Outro ponto, também importante, é como funciona a valorização do custo de revenda desses caminhões.

TranspoData: A tendência no Brasil é termos mais transportadores com frotas menores ou menos transportadores com grandes frotas?

Tayguara: Todo o mercado profissionalizado e organizado passa por um processo de fusões, isso não tem como não acontecer. A organização vai levando as empresas a ganharem mais mercado, isso é crescimento. Primeiro o crescimento orgânico e depois as fusões, isso é natural. As empresas se organizam, fazem a abertura de capital e adquirem mais recursos e montam essas estratégias: crescimento orgânico ou de fusões.

Aliás, isso tem acontecido muito nos últimos 10 anos. É difícil também afirmar que teremos no futuro poucos transportadores com grandes frotas e muitos com pequenas frotas, sendo que hoje, nós temos um mercado extremamente pulverizado. O mercado de logística e transporte no Brasil é de 500 bilhões de reais, portanto, é um mercado muito grande que tem espaço para muita gente.

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